Segue mais um belo texto do dr González. Copiei do GVA e a tradução é livre, desculpem os erros, alguns eu corrigi outros deixei como estavam porque não tinha o texto original.
A
abnegação - pediatra Carlos González
"Uma vez
esquecidos os ditosos horários e implantada a lactância em livre-demanda, a
maior parte dos problemas com a lactancia sao devidos a má posição. Como é
possível que existam tantos bebês mal colocados ao peito?
Depois de ler uma
larga e tediosa explicação precedente, um se vê tentado de dizer: "pois,
porque é tão difícil que ninguém explica". Mas não é tão difícil. Todos os
mamíferos mamam sem que ninguém lhes explique a posição correta e assim o
fizeram nossas antepassadas durante milhões de
anos.
Eu estava
preocupado. Demorei anos em compreender realmente qual é a posição correta,
anos de ler livros, ver vídeos e escutar os espertos. Como o conseguiam, então,
na cova da Altamira? (tempo das cavernas).
O mito da mãe
abnegada também contribui a que muitos bebês mamem em má posição. Por que o
bico do peito dói tanto? Um belisco no bico é muito mais doloroso que em
qualquer outro ponto da pele. Talvez tem que ser muito sensível para poder
reaccionar aos estímulos e desencadear os reflexos da
ocitocina e da prolactina? Não necessariamente. O que conhecemos como “tato”
são em realidade vários sentidos distintos, com distintos receptores e
distintos nervos. O bico do peito poderia ser tão sensível à pressão ou ao
contato, mas pouco sensível à dor.
Penso que a
extrema sensibilidade à dor serve para garantir que o bebê agarre bem ao peito.
Por que davam o peito as mulheres das cavernas, por que dão o peito os animais?
Porque se recomenda o médico, porque ouviram que é muito nutritivo e protege contra as infecções? Está claro que
não. O primeiro
motivo que levam as mães animais e humanas a darem o peito é, simplesmente,
para que o bebê se cale. O choro é um som muito desagradável, que impulsa a mãe
a fazeor algo para acalmar o bebê. Peito, braços, carícias, canções, seja o que
seja, mas que se cale.
Que passava nos
tempos da caverna quando um bebê mamava em má posição? O bebê chora, lhe dou
peito. Me dói, lhe tiro o peito. Chora outra vez, coloco o peito novamente. Me
dói novamente, tiro o peito outra vez...e assim até acertar com a posicao
correta: “anda, desta vez nao dói! Pois que mame todo o
que queira...” a dor é um aviso do nosso corpo que a mãe deve mudar de posição, assim, pode corrigir o problema antes que apareçam as fissuras, as mastites, os
vômitos, as cólicas...
Mas, em tempos
mais atuais, a lactância sofreu conotações morais. Uma “boa mãe” segue dando o
peito, ainda que lhe doa. Uma boa mãe se sacrifica e cumpre com o seu dever.
Uma “boa mãe” não
escuta as mensagens do seu corpo e segue dando o peito em uma má posição. Até
que saem as fissuras- E quando já nao pode suportar a dor, a ansiedade e o
esgotamento, quando se entrega e passe à mamadeira, os mesmo que lhe dizem:
“nao te preocupes, com os leites modernos se criam igual de bem”, a suas costas
comentarão: “ o que passa é que as mães de hoje nao aguentam tanto.”
Em conclusão, durante milhões de anos não devia de haver
quase problemas de posição. Depois de um parto natural, quando o bebê estava
nos braços da mãe desde o primeiro segundo e nao se movia dali em meses, sem chupetas nem mamadeiras e com
abundantes oportunidades para observar a outras mães com seus filhos. Quase
todas os bebês mamavam bem. E em caso de problema, a dor avisava à mãe para que
a corrigisse de imediato. A natureza não podia
prever que nossa sociedade chegaria a fazer todo o contrário.
E por que não
idealizou a natureza um sistema mais simples? Se a ocitocina fosse um pouco
mais efetiva, e todo o leite saisse a jorro sem esforço para o bebê, este
podia mamar ainda que estivesse mal
colocado. Tampouco havia dor ou fissuras. A idéia é tentadora, mas não pode funcionar. Se o leite saisse sozinho, o bebê
não tinha nenhum controle. Para que a quantidade e composição do leite se
adaptem às necessidades do lactante, é necessário que este mame de forma ativa.
Por isso, o leite não sai sozinho em nenhum mamífero, sempre tem que fazer um
esforço. Por isso, as vacas, cabras e ovellhas tem que lhes ordenhar, não basta
colocar um balde debaixo e esperar.
Por certo, já que
estávamos falando de abnegação materna, me permito fazer um alegato contra o
sacríficio. A palavra “sacrificio” tem várias definições e alguma delas nao
está mal: “ato de abnegacao ou altruismo inspirado por a veêmencia do
carinho.”. Mas também pode ser: “ação a que um se sujeita com grande
repugnância”, de modo que se presta confusões.
Se sacrifica um
alpinista para alcançar o cume? Se sacrifica o que estuda concurso para notario
ou pratica horas e horas o piano? Nao estão fazendo algo que lhe repugna, estão
fazendo o que desejam fazer. Eu não quero subir numa montaña nem ser notario, e
por isso não o faço.
Se vc quer levar
seu filho nos braços ou lhe dar o peito, façá-o. Se vc quer deixar de
trabalhar por alguns meses ou alguns anos para cuidar do bebê, ou rechaçar uma
magnífica oportunidade de trabalho no exterior para estar com sua família,
façá-o. Mas só se vc quer. Se não quer,
não o faça. Dizer:
“sacrifiquei minha carreira profissional para estar com meu filho” é tao
absurdo como: "sacrifiquei a relação com meu filho por minha carreira.”. Não
são sacrificios, são eleições. Viver é eleger, os dias só têm 24 horas, e o que
faz uma coisa não pode fazer outra ao mesmo tempo. Eleja o que em cada momento
te pareça melhor, e pronto. Quem faz o que quer não está renunciando, está
conseguindo, não se sacrifica, triunfa.
O matiz é
importante, porque quem faz um sacrificio, o faz, por definição, com grande
repugnância. Nao se considerada pagado, acredita que lhe devem algo. Cedo ou
tarde vc terá conflitos com os seus filhos. E nesses momentos, quem acredita
haver se sacrificado pensa: “parece mentira, depois de tudo que fiz por você”,
ou “por sua culpa, eu não pude chegar a...”
As palavras, uma vez pronunciadas, não
se pode voltar atrás. Em compensação, os que são conscientes de haver feito o
que desejavam mais bem pensam: “que pena que depois de todos os anos de
felicidade que você me deu, agora tenhamos um conflito.” ou “ graças a você,
disfrutei do privilégio de ser pai!"...
GONZÁLEZ, C. (2009).
Comer, amar e mamar. Madrid: Temasdehoy, p.292-294.
Tradução: Sandra Costa
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